Transcrição: Daniel Simões
Maria Lucia Fattorelli, coordenadora nacional da Auditoria Cidadã da Dívida, no Senado. 10.09.2019
Senhoras e Senhores Senadores e Senadoras,
agradeço especialmente ao Senador Paulo Paim que lutou para que uma
mulher tivesse lugar à mesa, ainda que com tempo reduzido. Agradeço
imensamente.
Eu quero deixar registrado nos anais dessa Casa que essa Reforma da
Previdência é uma pauta de interesse do mercado financeiro nacional e
internacional. A gênese dessa reforma vem da cúpula do sistema financeiro nacional.
É um modelo que está sendo imposto a vários países – o Governo usa até esse
argumento: que tem vários países fazendo esse tipo de reforma. Claro! Vários se
ajoelham da mesma forma ao que manda, o B.I.S. [Banco para Assentamentos
Internacionais, privado, com sede na cidade da Basileia, Suíça, paraíso fiscal]
que é Banco Central dos Bancos Centrais, o F.M.I. [Fundo Monetário
Internacional], o Banco Mundial [B.I.R.D. – Banco Internacional de Reconstrução
e Desenvolvimento], a cúpula do mercado financeiro.
Essa P.E.C. 006/2019 [Proposta de Emenda Constitucional - contém diversas
inconstitucionalidades - pelo tempo que estou tendo aqui eu não terei como
detalhar uma-a-uma, mas essa apresentação também vai ficar disponível: ela
destrói os alicerces da seguridade social conquistados em 88 e fere diversos
princípios constitucionais, principalmente, a vedação ao retrocesso social.
Se nós precisamos de R$ 1 trilhão – como diz o Ministro Paulo Guedes –
basta tributar as grandes fortunas. Apenas dois projetos – a P.L.P. 9/2019 [Projeto de Lei Complementar] que
tributa as grandes fortunas e a PL 1981/2019 [Projeto de Lei] que acaba com a isenção de lucros
e dividendos no Brasil – só esses dois projetos garantiriam uma arrecadação de
R$ 1,25 trilhão nos próximos 10 anos. R$ 250 milhões a mais do que o Ministro
gostaria com essa reforma. E atingiria quem? Atingiria as grandes fortunas e
atingiria os privilegiados que recebem lucros e dividendos isentos. Então,
vamos deixar de lado esse discurso de que precisa, de que tem déficit na Previdência: tem déficit porque falta receita; e falta
receita por causa dos privilégios; que os lucros não são tributados; as
fortunas não são tributadas nesse país.
O problema não está na Previdência. O problema está na política
monetária do Banco Central que produziu a crise, que gastou R$ 1 trilhão nos
últimos 10 anos para remunerar a sobra de caixa dos bancos de forma ilegal,
abusando das operações compromissadas. Nós temos dinheiro sobrando para
remunerar diariamente a sobra de caixa dos bancos? Essa é a prioridade do país?
Isso é um escândalo! De acordo com os balanços do Banco Central, foram R$ 754
bilhões, históricos, que se corrigirmos, chegamos ao trilhão.
Além do mais, essa operação gerou escassez de moeda no mercado, enxugou
mais de R$ 1 trilhão. Foi isso que produziu a crise! Foi o Banco Central que
produziu a crise usando essa medida que só privilegia a cúpula do mercado
financeiro. A desculpa de controlar a inflação foi desmascarada em 2017 e aì,
diante disso, o Banco Central enviou para o Congresso o Projeto de Lei9248/2017 que legaliza o depósito voluntário remunerado – que é o que já está
sendo feito. E isso está também no projeto de independência do Banco Central,
para legalizar isso. Então é preciso ficar claro: precisamos de R$ 1 trilhão?
Além do que eu já falei, basta fazer a auditoria da dívida pública – que só em
2018 consumiu mais de R$ 1 trilhão.
Os gráficos que foram apresentados aqui pelos que defenderam essa
reforma, apresentam apenas a parte do orçamento com a despesa primária, como se
o gasto da dívida indecente não existisse. É aì que está o rombo das contas
públicas!
Precisamos de R$ 1 trilhão? Já temos mais de R$ 4 trilhões em caixa:
temos mais de R$ 1,27 trilhão na caixa do Tesouro; temos mais de R$ 1,13
trilhão – esse dado é de Dezembro: atualmente já é R$ 1,42 – no caixa do Banco
Central; temos mais de R$ 1,5 trilhão em Reservas. Tudo isso na gaveta! E esse
dinheiro todo só pode ser gasto com gasto financeiro com a dívida. Então vamos
deixar claro: aqui já foi falado que é tudo uma questão de escolha. É uma questão
de escolha, sim! A escolha que está sendo feita nesse país é ser um país que
privilegia o rentismo e que empobrece ainda mais a sua população. Essa P.E.C. 6/2019 abre espaço para o esquema fraudulento da chamada Securitização de
Créditos. Ela já reduz o gasto social para abrir espaço para o desvio da
arrecadação tributária que acontece ainda durante o percurso pela rede
bancária, por esse esquema fraudulento que está no P.L.P. 459/2017 na Câmara dos
Deputados e agora numa P.E.C. 483/2018. Quem fala em déficit nunca leu o que está escrito no Art° 195 da Constituição Federal, que diz que a Seguridade será financiada pelo conjunto das
contribuições sociais e pelo orçamento público, orçamento fiscal. Então, desde
a Constituição até 2015 inclusive, as contribuições foram mais do que
suficientes para financiar a Seguridade Social. A partir de 2016 o orçamento
teve que inteirar. Isso não é déficit! Está previsto no Art° 195 da Constituição. Tivemos uma sobra de trilhões e para onde foi esse dinheiro? Não
fizeram essas reservas.
O déficit não está na
Previdência, nem na Seguridade Social. O déficit
está e sempre esteve no Banco Central. E eu agradeço pela oportunidade de falar
porque, até agora, esse ponto não tinha sido tocado. De 1995 a 2015 produzimos
R$ 1 trilhão de Superávit Primário.
Gastamos menos do que arrecadamos e apesar disso a dívida interna aumentou de
R$ 86 bilhões para R$ 4 trilhões no mesmo período. O que fez a dívida explodir?
Não é a Previdência – como já foi aqui falado na Mesa, erradamente por quem
defende essa reforma. O próprio TCU afirmou em audiência pública na C.A.E. [Comissão de Assuntos Econômicos] desse Senado, que a dívida não
serviu para investimentos no país. A dívida tem servido para transferir
recursos para o sistema financeiro, cada vez mais, através da remuneração da
sobra de caixa dos bancos; através dos escandalosos contratos de Swap cambial; através da contabilização
inconstitucional de juros, como se fosse amortização; através do pagamento do
maior juro do planeta. O rombo das contas públicas está aì, com a dívida. Os
dados oficiais comprovam: o rombo não está nos gastos com pessoal, nem na
Previdência. O rombo está no gasto financeiro!
O Governo fundamenta essa reforma em dados falaciosos. Não é a
Previdência que tem feito a dívida crescer: é a política monetária do Banco
Central. O déficit é fake! É falso! Privilegiados nesse país
são bancos e não servidores públicos que fizeram concurso difícil, pagam sobre
o bruto, não têm fundo de garantia, continuam pagando sobre o bruto depois de
aposentados – pensionistas também pagam sobre o bruto. Cadê o privilégio?
Privilegiados são os banqueiros e grandes empresários isentos de imposto de
renda sobre lucros bilionários. A tabela que está lá na página da Secretaria da
Receita Federal mostra que quem ganha acima de 320 salários mínimos por mês,
acima de 320 mil por mês, não paga imposto de renda, porque tudo é lucro distribuído.
A taxa de envelhecimento da população usada por quem defende essa
reforma subestima a população de jovens e adultos conforme estudo brilhante da
estudiosa Denise Gentil. Os desvios históricos da Previdência deixam de ser
computados. São vários estudos – inclusive um estudo do I.P.E.A. [Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada], orgão governamental que diz que os saldos
apropriados pela União entre 1966 e 1999, atualizados, daria quase R$ 1,6
trilhão. Muito mais do que se quer com essa reforma.
Não foram feitas reservas, temos renuncias fiscais injustificadas,
temos insuficiência de fiscalização e uma legislação perdulária que não
apropriação indébita.
Para encerrar, essa crise produzida pelo Banco Central, ela jogou a
economia na inanição; quebrou as empresas. E aì, empresa quebrada não paga
contribuição; desempregado também não. É aì que está a causa da crise. Os juros
elevadíssimos, essa combinação de juros elevadíssimos de remuneração da sobra
de caixa dos bancos esterilizando mais de R$ 1 trilhão; os prejuízos abusivos
com Swap câmbial são transformados em
dívida; emissão de título para formar colchão de liquidez. Esse conjunto é um
suicídio – como diz o famoso economista Thomas Pikkety.
A crise só está atingindo os pobres – a miséria extrema que já havia
desaparecido das estatísticas no Brasil retorna com 13.2 milhões de brasileiros
e brasileiras. Mas os bancos batem record
de lucro a cada trimestre quando enfrentamos queda do P.I.B. [Produto Interno
Bruto], desemprego, desindustrialização, quebra de empresas de todos os ramos,
empobrecimento... os bancos batem records
de lucro a cada trimestre por causa dessa política monetária do Banco Central
que fabrica a crise, joga o país na inanição e transfere dinheiro para os
bancos. E essa crise produzida por essa política monetária tem sido muito útil
para o mercado, porque o mercado é o beneficiário da emenda do teto – a emenda
95/2016 que deixou fora do teto os gastos financeiros com a dívida e os gastos
com as novas estatais para operar o esquema fraudulento da securitização. O
mercado é que se beneficia com essa Reforma da Previdência; o mercado é que se
beneficia com as privatizações e com a autonomia do Banco Central que quer
ficar acima de tudo e de todos.
Eu não vou ter tempo de falar das principais alterações dessa P.E.C.
[Proposta de Emenda Constitucional], mas fica aì registrado a infâmia. Enquanto
Paulo Guedes quer tirar R$ 1 trilhão da classe trabalhadora, R$ 1 trilhão do
mais pobres conforme tabela lá na última página de exposição de motivos da P.E.C.:
o trilhão vai sair dos mais pobres do regime geral. Mais de 80%! Os outros 20%
sairão dos servidores públicos! Enquanto R$ 1 trilhão é retirado da população,
essa reforma produz danos para as pessoas, para a economia do país e para as
finanças públicas. R$ 1 trilhão continua sendo destinado para remunerar a sobra
de caixa dos bancos.
O que nós precisamos é reduzir a desigualdade social no Brasil. É uma
vergonha! A 9ª maior economia do planeta ter a pior distribuição de renda do
mundo; ter o 79° I.D.H. [Índice de Desenvolvimento Humano] segundo a O.N.U.
[Organização das Nações Unidas]. Essa P.E.C. vai piorar isso daí. Eu faço
minhas aqui as palavras que o ex-Ministro Berzoini falou: que esse Senado
retire dessa pauta essa P.E.C. Essa P.E.C. não enfrenta o problema do Brasil.
Nós estamos entrando na pauta do mercado. A pauta que nós precisamos discutir
aqui é parar de aumentar a dívida pública de forma inconstitucional; reverter a
política monetária suicida do Banco Central que fabricou a crise, derrubou o
P.I.B. e a arrecadação; tributar a distribuição de lucros, grandes fortunas e
demais: I.T.R. [Imposto Sobre a Propriedade Territorial Rural], etc. Fazer a
auditoria da dívida com participação cidadã. Muito grata.
Transcrição: Daniel Simões
Apresentação de Lucia Fattorelli
Toda a sessão na TV Senado
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